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  • Foto do escritorJuliana da Paz

MAIS UM DESSES ROMANCES QUE NÃO DÃO EM NADA!

- Pois é! A gente, infelizmente, não faz a vida do jeito que a gente quer.

Foi assim que acabou aquele reencontro. Um dia foram noivos, prometidos um ao outro, foram moleques brincando juntos, afilhados da mesma madrinha, convidados das mesmas festas. Foram donos de uma história e de um passado no qual sonharam um agora totalmente diferente do que se tem.

Brigaram por qualquer motivo que agora, definitivamente, já não importa. Ela passou numa prova que a levava para outro país, faria parte de seu curso de arquitetura em Madrid. Foi tudo decidido no rompante do fim. O sofrimento foi tanto que os dois caíram nas contradições dos sentimentos. Ao invés de esperarem um pelo outro, sentiram-se tão perdidos sem suas presenças que procuraram tudo que faltava com amigos, festas, outras pessoas. Fizeram tudo tão irremediavelmente sem retorno que nunca mais se viram. Nunca mais toque, nunca mais “nossa música”, nunca mais.

E agora ela se via ali diante dele... Anos depois estava ali. Ele a jaleco e crachá de doutor.

E Valentina se perguntava, com seu filhinho no colo... Como poderia ele não me reconhecer?

Tudo bem que era mais magra, mais bronzeada, cabelos sempre coloridos. Talvez fosse isso! Os cabelos! Ele jamais conhecera a verdadeira cor dos seus cabelos, tantas vezes o pintou. Ele jamais a conheceu mãe, tão preocupada, Dudu fazendo graça e balbucios de comunicação. É. Não havia como reconhecer nela aquela menina que fugira de sua dor.

Todos esses pensamentos lhe ocorriam entremeando o diálogo médico.

- Pode sentar, senhora!

Foi seco! Gelo! Árido feito o branco das paredes do consultório.

- A senhora é a mãe?

- Sim!

Droga! Sua voz saíra frágil, doce, quase outra mulher, apenas pela presença dele.

Assim não lembrar-se-ia dela, aquela moça que se envolvia em debates sobre política e defendia veementemente suas convicções com voz firme, gestos fortes, às vezes, aos brados.

- É a primeira vez do paciente aqui?

- É...

- O que há com ele?

- Plaquinhas na pele, acessos de tosse. Eu sofro com os mesmos sintomas. Sou alérgica a ácaros, penso que ele sinta… Que sejam ácaros. Penso que seja o mesmo que eu sinto.

Palavras tropeçando… E uma ruga na testa do pediatra.

- Deixa eu examinar os pulmões dele. Segure-o nessa posição, por favor.

Ele continua educado e seco.

- Não há nada. Sugiro que façamos o exame de sangue para investigarmos. Vou passar. Aqui vão as indicações dos dois laboratórios que mais confio.

- Obrigada!

Agradece enquanto repara nas fotografias de duas crianças na estante do consultório. E em outra na qual está abraçado à esposa e à mãe.

- Eu que agradeço! Depois marque um retorno para me trazer os exames.

Antes de ir pergunta:

-Como vai sua mãe?

- Bem...

- Prazer, Valentina!


Um silêncio explodiu do centro para as bordas da sala de consultas. Até as prateleiras silenciaram e o faces do médico se desmanchou tal qual a casquinha do crème brulée, desmontando num olhar doce que a fez esquecer de todas as primaveras vividas à distância.




- Mas você não estava morando fora? E seus planos de não casar? Filhos jamais!... Seus cabelos são castanhos.

- E sua mãe, vai bem?

- Sim! Ela está morando no interior com meu irmão. E você?

- Eu vou bem. Nunca mais esqueça de olhar pra cara da mãe da criança. Meus cabelos são castanhos. Meus planos mudaram e pisaram no chão da vida real.

- Eu entendo... A gente fica adulto, né?


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